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Até que ponto uma arte como a ópera, que manteve intacto durante séculos seu modelo de apresentação, consegue se “adaptar” – entre aspas – ao ritmo acelerado dos tempos de hoje? Acho até que cabe uma pergunta anterior: mais do que conseguir se adaptar, será que a ópera precisa se adaptar ao timing do século 21? A utilização do tempo livre das pessoas mudou muito desde o início do século 17, época das primeiras encenações de ópera, até os dias de hoje. E nem é preciso ir tão atrás, basta retroceder até meados dos anos 1950, por exemplo. Naquele tempo, havia menosconcorrência de uso do tempo livre e o próprio tempo disponível das pessoas era bem maior. Em plena correria de 2011, é um luxo conseguir alocar cerca de três horas para assistir a uma ópera em teatro, fora os deslocamentos de ida e vinda. Sem contar o preço do ingresso, muitas vezes equivalentes a várias sessões de cinema, por exemplo. A escolha por um programa de longa duração e menos barato como a ópera requer mais reflexão hoje do que em tempos passados.
Mas o que fazer, então? Adequar a ambientação das óperas aos corridos tempos atuais, de forma a aumentar o link com o espectador e, consequentemente, aumentar seu grau de atenção e o valor da ida à ópera? Bem, isso já vem sendo feito há algum tempo, é bastante comum os diretores atualizarem época da trama e mesmo perfil dos personagens, mas sem mexer na parte musical. Ou que tal diminuir o tempo de duração das óperas, apresentando versões musicalmente condensadas dos grandes títulos líricos? E se a proposta for dupla: atualizar o tempo da trama e diminuir a quantidade de música? Na cidade de Hamburgo, na Alemanha, há uma iniciativa com essa proposta dupla. O Opernloft ocupa parte de um galpão antigo no centro da cidade e lá apresenta versões atualizadas e condensadas de óperas do repertório tradicional. Eles têm um projeto chamado Operabreve, sempre com 90 minutos de duração. A ação da trama é deslocada para dias de hoje e o figurino é moderno, a roupagem é pop. Até as árias das óperas podem ser tratadas por lá como canções pop. O projeto existe há anos e acumula boa repercussão. Achei interessante a fala de uma diretora desse projeto. Ela diz “Hoje as pessoas têm outra dimensão sensorial, com DVD's, playstation, cinema e efeitos especiais. A ópera precisa acompanhar isso". Realmente, a nossa dimensão sensorial mudou muito com a tecnologia, mas até que ponto o que é apresentado pelo pessoal do Operabreve pode ser mesmo chamada de ópera? Seria melhor uma outra palavra que expressasse aquele tipo de espetáculo cênico? Mais que uma questão etimológica ou semântica, temos aí uma questão estética. É bom acompanhar os próximos capítulos.
domingo, 27 de fevereiro de 2011
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Oi Heloisa,
ResponderExcluirConcordo plenamente, o que se discute é mesmo questão estética.
Ao vivo, ou no cinema (circuito Met), acho as óperas longas para a atualidade. Considero, no entanto, muito mais os motivos práticos, tais como a curta disponibilidade de tempo no cotidiano e o trânsito.
Quanto às alegadas mudanças de percepção, não as nego. Mas acho que justamente por tudo ser tão imediato e rápido na estética eletrônica que nos avassala, mais necessárias se tornam as experiências contemplativas, como a ópera.
Nada tenho contra as adaptações citadas, mas prefiro que elas se resumam ao tempo, sendo 90 minutos bastante raozável; e não ao tema.
O aspecto memorialístico, que tanto me encanta nas óperas, se perde com a adaptação às temáticas atuais. De resto, as narrativas atuais já têm os seus próprios (e múltiplos) recursos de memória.
Quem me dera poder ver mais óperas, em seu tempo normal!
Boa semana,
Eliane