terça-feira, 8 de junho de 2010

sidney, hong kong e miami dão caldo para o rio

li hoje três artigos na mídia on-line internacional que, juntos, dão um caldo interessante quando se pensa em cidade da música.

>> texto no musicalamerica.com sobre a inauguração de uma nova era na new world symphony de michael tilson thomas a partir de - e para além da - sua nova sala de concertos que fica pronta em outubro, em miami;

>> matéria em um certo the australian sobre o astronômico orçamento de 800 milhões de dólares para salvar a ópera de sidney da degradação total de sua infra-estrutura;

>> artigo no the wall street journal sobre o desenvolvimento de público para ópera em hong kong tempos antes de um novo complexo cultural ser inaugurado.

michael tilson thomas anuncia a inauguração do novo hall da new world symphony e, junto com o local físico, propõe uma nova postura da orquestra nestes tempos de internet consolidada. o discurso é do tipo "vamos tratar de fazer música clássica além da sala de concerto, para a enorme quantidade de gente que se interessa mas não frequenta". em tempo: a nova sala projetada por frank gehry senta apenas 756 pessoas.

povo da liga das orquestras americanas bate nesta tecla há tempos, mas não se referindo necessariamente a utilizar web e redes sociais para difundir música sinfônica. a liga insiste que a orquestra tem um papel fundamental para a sociedade como um todo e não apenas para as poucas centenas que frequentam seus concertos. eles usam um conceito que acho ótimo: a orquestra deve assumir o papel de "usina de música" de sua comunidade. uma vez que requer uma quantidade grande de recursos para existir, a orquestra pode e deve estar ao alcance de todos....e, para tal, precisa ir até eles. enquanto não compreender isso e mergulhar de cabeça na rotina da cidade, vai ser vista e sentida como arte para poucos. vai perdendo importância com o passar do tempo.

o novo hall da new world symphony foi completamente projetado para os meios de comunicação do século 21, possibilitando transmissões on-line e também para mil pessoas do lado de fora do prédio, telões no palco para projetar as notas de programa e closes dos músicos enquanto tocam.

essa realidade americana me fez pensar, meio chocada, no complexo cultural cidade da música, no rio de janeiro, tomando maresia nas estruturas fechadas desde sua inauguração fake, em dezembro de 2008.

já o artigo sobre a degradação da ópera de sidney, cartão postal da austrália para o mundo, também fez lembrar um pouco o debate - falta de debate, melhor dizendo - em torno da cidade da música.

o complexo cultural de sidney é lindo do lado de fora mas, pelo jeito, micado do lado de dentro. levou quase 15 anos para ser completado (1958-1973) e seu projeto original sofreu inúmeras modificações. passados mais de 35 anos de atividades, são necessários 800 milhões de dólares para garantir que o Teatro de Ópera (um dos espaços do complexo) funcione com eficiência e segurança, voltando ao projeto original que havia sido descaracterizado durante a construção. só um túnel de acesso para caminhões transportando equipamentos fica em 152 milhões de dólares. cifras astronômicas.

por último, o artigo do wall street journal fala do trabalho de formiga de um homem chamdo laurence scofield, visando despertar interesse do público de hong kong para a cena lírica. está sendo construído naquela cidade um grande complexo cultural que envolve teatro para ópera. como os chineses não são exatamente fãs da ópera ocidental, que mágica fazer de modo a garantir que a sala de 2.000 lugares fique cheia quando abrir em alguns poucos anos?

e não é que isso também me fez lembrar da cidade da música? há quem ainda acuse o projeto de estar cravado na zona oeste, mais especificamente na barra da tijuca, área do rio de janeiro em que a música clássica não teve ainda a sua vez. por outro lado, uma área de enorme ocupação populacional. "de que serve tanta gente, se eles não gostam de música?", é o que tem se ouvido por aí.

laurence scofield tem sensibilizado o público de hong kong organizando, por lá, as sessões de cinema com óperas do metropolitan de nova york (aqui no brasil, elas passam desde a temporada passada). scofield compreendeu que é preciso oferecer ópera para que as pessoas possam decidir se gostam ou não do gênero. a surpresa é que, ao contrário dos prognósticos, a coisa está funcionando por lá. a sala onde são exibidas as sessões de cinema senta apenas 125 pessoas. com o tempo, o projeto está crescendo.

2 comentários:

  1. Prezada Heloísa, em que pesem as acusações de superfaturamento (a serem devidamente apuradas), não acho que a idéia da construção da cidade da música tenha sido mais um desvario alucinadamente tresloucado do então prefeito César Maia. Isso porque é importante não somente ampliar os espaços destinados aos espetáculos musicais, mas também é preciso estabelecer um centro de fomento e irradiação da música ao alcance de parcela da população que ainda lhe é quase absolutamente alheia. Obviamente, um belo projeto arquitetônico não tem o condão de, por si só, criar e educar platéias; é necessário que uma eventual parceria público-privada se estabeleça a fim de se alcançar resultados positivos; no entanto, já que considerável fatia da mídia vem sistematicamente alijando a população do acesso à boa música, toda iniciativa em contrário é válida. Esse parece ser o ponto nevrálgico da questão: se os meios privados de comunicação social perversamente despejam lixo travestido de arte no mercado consumidor da música, para quem têm sido destinados os apropriados espaços públicos senão às elites? Ora, se todos contribuem por meio do pagamento de tributos, há que se democratizar o ingresso às salas de concerto, bem como o incremento de execuções radiofônicas e televisivas, ainda que precipuamente por meio dos canais públicos, além da utilização da internet. Para tanto, como sabemos, são necessários elevados recursos financeiros que, para muitos desavisados, deveriam ser revertidos, por exemplo, em obras de saneamento básico ou quaisquer outras de combate à pobreza endêmica. Ora, se é primordial que seja erradicada a miséria neste País, também o é que seja extirpada a miséria cultural que nos relega à quase indigência - até por falta de senso crítico. Prover a população de um mínimo existencial material não exclui a necessidade de suprir-lhe as carências que somente a arte é capaz de fazê-lo. Aliás, de que valem corpos saudáveis guiados por mentes espiritualmente vazias?...

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  2. Coisa linda o seu comentário sobre bandas, hoje, Heloísa. Eu também acho que essa atividade deve ser valorizadíssima.

    Em Diamantina, há uma banda infanto-juvenil sensacional. Uma das fotos da capa da minha tese de doutorado é justamente dessa banda, em apresentação na Igreja do Amparo.

    Um grande abraço,
    Eliane.

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